terça-feira, 9 de junho de 2009

Tragédias Silenciosas

Submersas por uma lâmina de um espelho inesperado, mandado, talvez, pela alma do Planeta ferido, as cidades nordestinas sofrem as conseqüências da devastação e do desequilíbrio. E ainda dizem que não acontecem tragédias no Brasil.

Não quero ser pregador do pessimismo, mas as maiores tragédias acontecem silenciosamente. Não se faz alarde porque já estão comuns e há pouquíssima reação contra elas.

Quando vejo troncos deslizando nos rios amazônicos, sinto a força de um terremoto cujo epicentro está no bolso dos inescrupulosos parasitas da natureza. São pintores maus e, em nome do lucro, insistem em "amarronzar" o verde da parte de cima do nosso mapa. Isso é uma grande tragédia.

Quando vejo falsas duplas sertanejas, pagodes e axés descartáveis, sofríveis bandas de forró e outras gravações ridículas ocuparem quase toda a mídia, por determinação desta manipuladora de gostos, que empurra a porcaria para consumo imediato e deixa o grande público sem direito à alternativa de qualidade, sinto a força de um furacão. E os poetas, instrumentistas, compositores, cantores que produzem arte são varridos para um canto, onde a elite, por querer intimidade com o culturalmente correto, consome, e os de bom gosto e sensibilidade estimulada apreciam.

Não precisaria nem citar exemplos na política brasileira para caracterizar esta como fonte de tragédias. Mas é bom lembrar: A corrupção é uma grande tragédia que fomenta milhares de outras, como as obras inacabadas; o superfaturamento; o sistema educacional ineficiente; o sistema de saúde insatisfatório; o desemprego e outras já muito debatidas. E ainda é regra no espírito público. Os honestos são raríssimas exceções.

Não podemos deixar de registrar, nesse cenário de acontecimentos trágicos na ecologia, na política, na economia, na arte, alguns avanços na sociedade brasileira. Todos nós sabemos que houve afrouxamento na democracia e maior consistência na economia.

E quem seria o vilão de todas as hecatombes, nacionais e internacionais? Quem provocou e ainda provoca todas as guerras contemporâneas? Quem destrói e desequilibra a natureza? Para tornar impessoal essa culpa, alguém diria: Não é quem, é o que. Pois fingiremos aceitar esse argumento. Então, o que causa e se beneficia de todas as tragédias? A resposta é fácil: O Capital. E isso não é discurso marxista, é apenas a constatação de um fato. Há, porém, uma complementação a ser feita: O Capital não tem vida própria; por trás dele existem homens ambiciosos que fariam qualquer coisa para vê-lo crescer. Por outro lado, milhões de pessoas simplesmente se omitem e deixam as tragédias seguirem, em silêncio, como se milhares de crianças morrerem de fome, ou por causa de doenças evitáveis, fosse menos importante do que a queda de um avião.

Nós provocamos as tragédias. Nós somos os vilões dos problemas ambientais e sociais; Os intelectuais que aceitaram passivamente a reviravolta ideológica, simbolizada na destruição de um muro como o fim da esperança de uma democracia mais verdadeira; Os políticos que compraram o bilhete na segunda classe dessa aventura suicida, deixando para trás o sentido da palavra revolução e o contraponto da metafísica, ou seja, o materialismo dialético; Os omissos diante da permanência das contradições desse velho sistema que comprova: Somos, realmente, os lobos de nós mesmos.

E não adianta dizer que a salvação é o modelo de democracia que conhecemos, pois isso, para mim, é o maior engodo que poderia ter sido empurrado na goela dos menos esclarecidos. É querer acabar com a esperança de um dia unir-se a paz com a justiça. A perda da esperança, sim, é a maior de todas as tragédias.

Paulo Viana

4 comentários:

Sávio Pinheiro disse...

Paulo Viana,
Estes dias eu vi e ouvi duas festas juninas, ambas sem forró pé de serra, sem Luiz Gonzaga e sem o Trio Nordestino.
Assisti a um show do Caetano Veloso, onde o mesmo foi vaiado por não cantar Alegria, Alegria, Sozinho e Atrás do Trio Elétrico.
Vi um leitor não valorizar uma pérola do poeta Crispiniano Neto porque era Literatura de Cordel e este tipo de poesia ainda não é considerado como estilo literário.
Pois bem, concordo com você ao denunciar estas práticas nocivas do capitalismo através das suas crônicas e contos, onde nos faz chegar a conclusão que se não gritarmos alto ou lutarmos com coerência, estará desfeito o sonho do autêntico, da tradição e da cultura.

Saudações juninas com baião de dois, arroz mexido, pão de arroz e arroz doce.

Paulo disse...

Caro Sávio,
Sei que você é um desses bravos resistentes que através da Literatura de Cordel mantém a cultura genuinamente brasileira em evidência.
Eu também resisto. Aliás, muitos ainda resistem. Porém, se desistirem, enquanto pelo menos um de nós dois estiver vivo, essa resistência continuará.
A despeito da decadência do forró, escuto sempre Jackson do Pandeiro, Luís Gonzaga e Abdias e também lamento a descaracterização dos nossos valores culturais, sem desconsiderar as inovações que se façam necessárias.
Saudações Juninas, acrescentando Canjica, Pamonha, Pé de moleque, Beiju e Rapadura.
Por falar em rapadura, gostaria de indicar meu texto "A Rapadura e o Orkut", se você ainda não leu. É só clicar nos Posts mais antigos e procurar. Trato justamente desse assunto.
É sempre bom receber seus comentários.
Muito grato pela companhia nessa peleja.
Um grande abraço

Isabel Branco disse...

Paulo

Grata pela força e simpatia das suas palavras.

Cada pensamento,
um momento!
Cada simples verso,
uma frente e um reverso...
Assim, me alento
assim, minha rua atravesso.

Um beijinho.

Felipe disse...

Paulim,

"Não se afobe não que nada é prá já!..." apenas temos que seguir espalhando as nossas crenças pela vida afora e cá dentro de nós. Se não conseguirmos salvar o planeta, pelo menos vivemos e descansaremos em paz! Abraço.