segunda-feira, 25 de maio de 2009

A Retórica e o Diabo


                        Se o diabo existisse, estaria assistindo a tv e rindo das desgraças que acontecem no mundo. Certamente, teria ganhado a aposta com Deus, se tivesse feito, que o ser humano, entregue a esse tal livre arbítrio, não daria certo e sucumbiria por causa da sua ambição e de sua fome de poder. Brindaria sua vitória por ter conseguido manter, por tanto tempo, em tantas pessoas, a injustiça, desigualdade, fome, corrupção, egoísmo e nenhum amor à vida e ao Planeta.

       O diabo não existe. Aquela figura chifruda foi criada pela igreja católica para associar os símbolos das religiões concorrentes ao mal. O que existe, de fato, são as relações entre as pessoas e entre elas e o Planeta. O que existe mesmo é uma trajetória movida pelo interesse no poder, no prazer em demasia, fundamentada pela criação de doutrinas convincentes, como a democracia, cuja prática está longe de se assemelhar à teoria. Sem contar os problemas hormonais e os transtornos psicológicos.

                        Cabe, aqui, uma pergunta: de que adianta esse discurso romântico? Onde estão os ideais de liberdade, justiça, igualdade e fraternidade? Onde está o humanismo? Ah! - Diria o diabo depois de mais um gole diante da tv - A retórica foi um artifício que eu adicionei à razão humana. Esta seria muito pobre se a lógica formal fosse sua única vestimenta. Dei uma incrementada no uso da palavra para que, o que parecesse verdade, de um lado, fosse mentira do outro. Assim os pobres seriam enganados com mais facilidade e os ricos viveriam em paz.

                        Deus, com sua fé inabalável, mantém-se calado, acreditando que um dia a razão, despindo-se da retórica e usando a lógica, dirá: Não podemos mais admitir tanto alimento apodrecendo nos supermercados, enquanto tantas pessoas morrem de fome no mundo. O diabo continua apostando no ideal capitalista: o lucro. Mas o diabo não existe e Deus é uma prerrogativa da fé que os seres humanos têm em sua capacidade imaginativa. Acreditaram tanto em Deus, ao longo da história, que hoje é quase impossível ele não existir. Afinal, a quem os pais confiariam a vida dos filhos, quando saem de casa, neste mundo em que o diabo dá as cartas?

                        Como bom idealista, mantenho a minha fé, pois existem pessoas boas e haverá um momento em que os seres humanos estarão materialmente equilibrados. Acredito, até, que há potencial para haver uma mudança espiritual e, como desdobramento, diminua muito o sofrimento no mundo. Mas não posso mais acreditar nessa retórica de Democracia, Deus, diabo, crescimento econômico e outras artimanhas da inteligência humana. Essa conversa me cansou. Não me convence mais. O que me convence é a boa vontade, a capacidade de perdoar, a solidariedade e o desapego. O que me estimula é a ação positiva, concreta, que não usa a retórica, porque esta é atributo das palavras e as palavras, sozinhas, são apenas lembranças do que aconteceu ou prenúncio do que poderá acontecer, não são os acontecimentos. 

 

                        Paulo Viana