Tenho recebido alguns e-mails com textos referindo-se ao comentário de Obama sobre o Presidente Lula e à foto dele em posição de destaque, junto à rainha da Inglaterra. Alguns festejando, outros ironizando, porém com certo orgulho. Tudo porque o Lula está perto da rainha da Inglaterra.
Muitos brasileiros têm a mania de analisar os fatos pondo as questões econômicas e regionais como determinantes para a valorização das pessoas envolvidas neles. Eu diria que são fatores importantes para a análise, porém não da forma como são postas, ou seja, quem tem mais dinheiro é mais importante.
Há uma inversão de valores nesse contexto. Não é o Lula, nem nós, brasileiros, que temos que nos orgulhar por ele ter ficado ao lado da rainha. Lula nasceu em um distrito de uma cidade do interior de Pernambuco, atravessou quase todo o Brasil em busca de dias melhores; não estudou porque tinha que trabalhar para ajudar no sustento familiar; teve a perspicácia para perceber a realidade à sua volta e seu potencial de líder; foi inteligente para seguir sua intuição e apontar seu destino para a vida pública; foi corajoso para enfrentar um regime agressivo, com defensores cruéis e injustos; enfrentou o preconceito por ser nordestino e não letrado; participou de quatro campanhas para presidente de um País dominado pela aristocracia rural e a burguesia empresarial, tendo a vida vasculhada de todas as formas possíveis, sem que, se quer tenham encontrado um detalhe mínimo que desabonasse sua vida pública, e, finalmente, de forma audaciosa, aumentou os impostos para sustentar um programa emergencial, que só valoriza quem o recebe todo mês e come por causa dele.
A rainha é apenas herdeira do trono. É fácil ter nascido na Inglaterra, nação erguida com as riquezas arrancadas de suas colônias; pertencer à família real; ser adulada por que faz parte dessa inexplicável elite ultrapassada, que ainda se sustenta na crença de que algumas pessoas têm mais nobreza do que outras. Sei que é uma tradição. Absurda tradição. Mas, é lá que está a rainha. É lá que os acometidos da síndrome do complexo de não ser europeu ou americano veem a graça da sociedade humana e a grandeza das personalidades. É lá que alguns veem a importância do Lula. Como se a rainha fosse uma estrela de grande porte e o Lula um simples planeta, sem brilho
Estão enganados aqueles que glorificam Lula pela posição na fotografia da reunião do G20. Ela, a rainha, sim. A rainha é que deve se orgulhar de estar perto de um brasileiro, nordestino, pernambucano, torneiro mecânico, que conseguiu superar todas as suas adversidades e chegar ali, sentado ao lado de quem apenas andou de determinado cômodo do palácio para outro, mais importante. Ela é que deve se orgulhar da presença, ao seu lado, de um ser humano cuja alma foi enriquecida pela vivência, pelo sofrimento, pela luta diária, sem se deixar abater, acreditando que um homem é um homem, seja aqui, na caatinga, seja lá, na terra dos bretões. É diferente de ser agraciado com uma coroa, porque o rei está morto.
Não sei se foi o protocolo ou se foi a própria rainha quem determinou a organização das pessoas para a foto. Pode até ter sido ela que, num surto de nobreza verdadeiramente humana, quis sentir o cheiro de uma pessoa real, de um homem que vestiu-se de vida e trilhou um caminho com a dignidade que os outros acham que ela, a rainha, é quem tem.
Por isso, brasileiros que exaltam o Lula pela foto, não o façam por isto, porque, assim vocês estarão exaltando a rainha. Exaltem o Lula pelo que ele representa de vida vitoriosa. Exaltem o Lula não só pela conquista de um lugar ao sol, mas por ele ter conseguido brilhar com sua própria luz. Os outros que possam nele se espelhar e dizer: “Esse é o cara!”.
Paulo Viana