Queria ser um filósofo, para mergulhar na realidade e, ao nadar entre verdades relativas, descobrir uma verdade absoluta, pura, que produzisse todas as outras. E nesse mergulho pudesse ainda vislumbrar as sutis relações entre o bem e o mal, a ilusão e o mundo real, divisando as fronteiras do consciente e do inconsciente e catalogando os sinais da alma. Pudesse compreender, claramente, as motivações dos pensamentos, a formação da paixão, o despertar do medo, a existência da violência, a importância do poder. Um filósofo que conhecesse a função verdadeira da política.
Queria ser um filósofo que penetrasse no mundo onírico e traduzisse a linguagem dos sonhos, codificando símbolos, comparando-os com as experiências quando estamos acordados. Queria ver a lógica do desejo, estudá-la profundamente, apreendê-la, de forma que faltasse pouco para conseguir controlá-lo sempre, mesmo em sua versão mais intensa. Um filósofo, cuja percepção dos dados sensíveis fosse tão aguçada que coincidisse com a própria realidade. Queria poder entrar, sem respirar, no silêncio, onde não existisse nenhum barulho, nem mesmo aqueles não audíveis aos humanos. No impossível mundo do silêncio absoluto.
Queria ser um filósofo que sentisse a música como se estivesse cavalgando em instrumentos musicais pelo mundo transcendental, vendo o bailado da melodia, da harmonia e do ritmo. E nesse mesmo momento pudesse contemplar o mundo metafísico, apreciando o desenho original de todas as coisas. Queria retornar ao mundo sensível através da intuição, para conhecer os caminhos que ela percorre. E, ao retornar, colocasse em debate a Razão e a Emoção, para que resolvessem suas diferenças. Extrairia a solidão do sentimento e o deixaria apenas com a alegria, com tal zelo que a tristeza só teria espaço em momentos de perdas muito grandes, para ocupar um pouco o coração. Queria ser o filósofo que demonstrasse apoditicamente a existência do amor e seus benefícios para a anulação do ódio e a justificação da existência.
Queria, finalmente, ser um filósofo capaz de surpreender o tempo e descobrir seus segredos, dominando-o, para que não pudesse mais levar nenhum de nós, em sua viagem, porém nos ensinasse a unificar corpo e espírito, a deixar de confundir desejo com algo estranho a nós mesmos e a jamais perder o encanto pela vida. Por fim, compreenderia o que é viver e seria um filósofo perfeito.
Paulo Viana