Por muitas vezes disse-me o Sol, que, a despeito de deixar-se levar, diariamente, pela envolvente dança dos astros, sempre voltará, tão brilhante quanto antes, tão promissor quando o fora, ao provocar a verve do poeta, em crepúsculos inimagináveis. Quantas vezes disse-me, ele, que, ao nos deixar a noite, deixa também a missão de refletirmos profundamente sobre o dia, sobre nossas ações, nosso jeito de contemplarmos o outro, de amar, de construir riqueza sem destruir a vida, de compreender a Natureza como única possibilidade de sobrevivência.
Todo dia, quando nos brinda com matizes que só seus pincéis, untados de luz, são capazes de pintar, justamente ao deixar seu turno neste lado, provocando, incansavelmente, auroras belas em terras orientais, ele se despede com sutis mensagens, com lembretes profundos, sobre a marca imponderável do tempo. Como nos alerta, essa estrela, sobre o quão pequenos somos e, ainda, o quão grande poderíamos ser, se o nosso espírito seguisse a lógica simples do respeito ao equilíbrio, ao desejo de eternizar-se, atributo indelével que permeia a essência da vida!
Pudera eu, Sol, falar a linguagem escrita nesse azul, luminosa ilusão infantil, para te segredar sobre nossos descaminhos; Sobre como nos desviamos da rota de um projeto de felicidade simples para o desastre, em busca do inalcançável escopo de um poder absurdo, desumano, antinatural, equivocado, movido em dimensão sem controle e fadado ao inacreditável desfecho do suicídio da nossa própria espécie.
Mesmo assim, há os que acreditam e lutam por um despertar do sono torpe. Há os que celebram a música, a poesia, a cor do ocaso, a alegria por estar vivo e o amor; Os que acreditam na paz; Os que expressam sua indignação pelo estado em que deixaremos a casa dos que virão depois. Há, por fim, aqueles que entendem a trajetória do sol, não apenas como o passar dos dias, mas como uma calorosa mensagem sobre o momento presente e, sobretudo, os próximos momentos, pois ele, Sol, com certeza estará lá. Temo que poderão existir crepúsculos, gratuitos cartões postais, sem que haja uma pessoa para admirar.
Paulo Viana