sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

A Mulher e o Homem

Escritores, filósofos, psicólogos, poetas, pessoas comuns e outros seres falantes tentaram descrever, de forma acabada, com adjetivos definitivos, o Homem e a Mulher. Das tentativas que eu conheço, a mais bonita é a de Victor Hugo. Ele consegue evidenciar as diferenças sem degradar nenhum, pelo contrário, eleva-os a uma categoria divina, que nos fazem presumir serem obras de um ser muito superior.
Com todo respeito a Victor Hugo e a todos os outros, quero falar sobre homens e mulheres sem idealizá-los, concentrando-me na vida real, no calor da convivência diária, com dores, alegrias, decepções, frustrações e conquistas.
É bom lembrarmos que os homens e as mulheres mudaram muito, ao longo da história, com estas ocupando espaços, hoje, que em outros tempos eram muito “inadequados”. Limitações defendidas pelas religiões, que, de certa forma, masculinizaram Deus e “feminilizaram” o diabo.
Todos os processos culturais, embora diferenciados, mantiveram em comum a realização instintiva da reprodução da espécie, numa estrutura em que se preservava a união básica entre os dois, homem e mulher, para a garantia do desenvolvimento da cria, cuja dependência exigia uma proteção fortalecida pela organização de um núcleo, com tarefas bem definidas. Em princípio, o homem, por ser fisicamente mais adequado às tarefas perigosas, saía para caçar e guerrear. A mulher permanecia em “casa”, fazendo os, não menos pesados, trabalhos domésticos e cuidando dos filhos. Uma vida simples, saudável e com as dificuldades próprias da situação. Os anseios resumiam-se na garantia do alimento e da sobrevivência do núcleo familiar. O homem era o provedor, o que tinha o poder e a força. Achava-se ele, portanto, mais habilitado a ser o interlocutor dos Deuses, chegando a oferecer as mulheres, em sacrifício, para acalmá-los. Talvez, como os animais totêmicos, a mulher tenha sido uma das primeiras versões de moeda. O homem já demonstrava o seu egoísmo, num ato em que dizia aos deuses: se queres um de nós que pegues a mulher.
Louve-se a mulher, que, a despeito da história, dos livros sagrados; das religiões; dos homens; da desvalorização do seu árduo trabalho doméstico e de sua capacidade gestacional, conseguiu se reclassificar na avaliação da importância dos membros do casal, saindo da condição de coadjuvante para tão importante parceira, não só na realização das tarefas para proteção do núcleo, mas, fundamentalmente, na construção de uma civilização menos arrogante, mais sensível, mais preservadora e mais honesta. E se algumas cometem certos erros é porque se deixaram contaminar pelas práticas dos homens, no que de pior eles têm.
As mulheres estabeleceram uma meta e não é a igualdade com os homens. Isto não só é impossível, dada as características diferentes, mas desnecessário, porque elas querem ser mulheres, com direito a viverem todo o seu potencial, e não ser como os homens. Elas não querem ser apenas objeto da poesia, da filosofia ou da psicologia; elas querem viver a poesia, filosofar e realizar-se em toda a sua psique.
Os homens, antes patriarcas do núcleo, as figuras que determinavam os caminhos, olham, hoje, com perplexidade, as mulheres passarem em suas caminhadas rumo a elas mesmas, e nem percebem que elas os convidam. E se não cuidarem elas vão mesmo sozinhas. Eles, por sua vez, não sabem mais andar, estão parados, porque, na realidade, nunca souberam, sempre tiveram o apoio das mulheres. Estas sim, descobriram que podem ir longe, sem eles. Melhor com eles, se quiserem.. Não com os homens fragilizados pela perda da hegemonia, mas com os homens que reconhecem as mulheres como guia e que possam segui-las , pois elas carregam consigo um mapa de um caminho menos tortuoso. Um caminho que os levará para uma vida mais promissora, onde o amor é a palavra chave, onde o feminino e o masculino não sejam apenas referências para diferenciar o sexo e sim elementos base de um ser humano único, mais completo, fundidos com um só interesse: a elevação da vida como a verdadeira obra-prima da Natureza. Enquanto isso é assim que vejo o homem e a mulher. A mulher idealizando-se a cada conquista e o homem desconstruindo-se enquanto ideal. Neste momento, em que eles se cruzam em jornadas cujo caminhos têm sentidos opostos, é a oportunidade de se unirem, desta vez sob o comando das forças femininas, para reescreverem a história da humanidade.

Paulo Viana

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

O Tempo e a Vida

Gosto de escrever sobre assuntos não comuns, que tratam do ser humano, dos seus descaminhos e equívocos. Hoje começo dizendo que as crianças vivem como se fossem eternas. Não se preocupam com o futuro, com a velhice e nem com a morte. O momento mais importante é aquele em que está vivendo e, quando têm que esperar, a ansiedade é vivida intensamente e o momento é antecipado, com a imaginação. As que são felizes pensam que serão felizes para sempre e as que sofrem acreditam que sempre sofrerão, embora tenham pequenos lampejos de esperança que se desfazem logo, com a dura realidade. Um momento de tristeza para a criança feliz causa-lhe revolta, enquanto uma alegria para a criança triste causa perplexidade. A infância demora mais na vida de uma criança feliz. Na outra, quanto mais rápido for adulto mais possibilidade de diminuir o sofrimento. Certo é, no entanto, que ambas, continuando vivas, ficarão adultas.
Quando adultos, o tempo parece passar mais rápido; os dias e os anos correm e a verdade da finitude nos causa um grande desencanto. Tão grande é o desencanto que nos apegamos a quimeras religiosas que anunciam a vida eterna, a reencarnação e outras promessas irrealizáveis. Aqueles que não embarcam nessas promessas se apegam à vida material, embelezam-se com o consumismo, com o acúmulo de poder e riqueza, mesmo que tenham que declinar da ética e da busca de um sentido mais consistente para a vida. A palavra de ordem é gastar a vida a qualquer custo.
Pobre criatura, alienada; brilho infinitesimal, cujo tempo de vida não chega a um piscar dos olhos da eternidade; cuja morada, que degrada sem dó, com sua ignorância exacerbada, é apenas um ponto insignificante, diante da incalculável quantidade de estrelas e astros. Pobre criatura, que num devaneio patético concebeu um ser, que chamou de Deus, e a este atribuiu a construção do universo, responsabilizando-o pelos seus próprios desígnios, pelos seus problemas de consciência, pela sua atabalhoada saga. É a ti, pobre ser humano, que quero dizer: não precisa dar cabo da tua raça e nem da tua casa. Não precisa viver teu curto tempo da vida como se apenas tu importasse. Não precisa antecipar o fim.
A Natureza, essa mesma que cuidas em alterar a teu bel-prazer, te surpreenderá um dia, com tão contundente golpe que não sobrará nem mesmo as sementes que te fizeram brotar, e, como os Dinossauros, sairás de cena definitivamente. Então, por que antecipar a morte do Planeta? Deixa que a Natureza siga seu curso. Quem sabe, nossa civilização, com mais juízo, não possa salvar-se em outra casa; num planeta que venha a descobrir e com uma tecnologia, que venha a desenvolver, se tiver tempo?
Não é porque a nossa vida é passageira que devemos desprezar as próximas gerações. Não é por Deus e nem pela Natureza, que devemos salvar a humanidade. É porque o ser humano é um projeto tão bonito, tão promissor que é lamentável não ter tempo para se redimir, para se retratar, diante de si mesmo.
Portanto, desejamos que quando um asteróide, um grande meteoro ou qualquer outro astro venha a se chocar com a Terra, estejam os humanos ocupando, de forma inteligente, outro planeta, que certamente se chamará Nova Terra. Onde as crianças, cientes de que um dia morrerão, saberão valorizar a vida, e os adultos, conscientes de sua existência, saberão valorizar a morte. E todos os seres vivos possam esgotar todo o seu potencial que lhes tenha sido destinado a viver, sem serem ameaçados pelos próprios humanos, como somos hoje. E que a vida dure até que um novo meteoro se choque com o Planeta. Afinal, a Natureza tem seu próprio movimento e não nos diferencia do restante dos seus entes. Para ela, somos apenas uma pequeníssima parte. Embora alguns tenham feito muitos acreditarem que éramos especiais e protegidos, porque fomos criados à imagem e semelhança de Deus. Na realidade, nós criamos Deus à nossa imagem e semelhança. Quem nos criou foi a Natureza e ela é que é senhora do nosso destino.
Paulo Viana