quinta-feira, 13 de maio de 2010

Dois Olhares

Vasculho pensamentos, procurando uma idéia original que possa desenvolver e transformá-la num texto, e o que me aparece são estímulos a verbalizar, com indignação, sobre injustiças, degradação da natureza, corrupção, desigualdades entre povos e, principalmente, o egoísmo e a indiferença. Por outro lado, surgem, como contraponto, conceitos como paz, liberdade, solidariedade e amor. Tenho, portanto, a força da contradição para impulsionar minha vontade de escrever.

Se utilizar os primeiros conceitos, certamente estarei falando sobre humanos, em especial de homens públicos, justamente de onde saem a grande maioria das histórias envolvendo tais palavras. Também estaria falando sobre humanos se minha abordagem tratasse de situações onde aparecesse o segundo grupo de palavras, e aqui estariam os poetas.

Quem disse, no entanto, que os poetas não podem se indignar com as injustiças? Quem pode afirmar que um vate engajado não versifique sobre o egoísmo dos corruptos? Claro que a poesia se veste com as palavras tecidas com maestria, musicalidade, imagens bonitas e lirismo. Corrupção, para o poeta, é a desfeita do diabo, com sua lábia persuasiva, conduzindo espíritos puros para o descaminho. O poeta vê a degradação da natureza como um substituto cruel da paisagem, como um desvario de um caminhar desvirtuado dos homens.

E os políticos? Como veem a paz, a solidariedade e o amor? Eles simplesmente não veem, pois a ganância por dinheiro e poder os cegou. Não são os olhos que não enxergam. É o coração petrificado pela indiferença e pelo egoísmo que perdeu seu olhar de poeta.

Existe um oftalmologista que possa curar a cegueira do coração? Temo que não. Só uma revolução cultural profunda poderá fortalecer os olhos dos corações ainda jovens. Não que eles tenham que ser poetas, mas que possam enxergar com sensibilidade a vida e veja o outro como uma expressão de si mesmo, de sua natureza, suas necessidades, suas carências, sua humanidade. E que deles saiam os políticos e os poetas. Não que a natureza humana seja totalmente transformada e que só existam homens virtuosos. Isso é impossível. Mas que, pelo menos, sejam eles a grande maioria. Os desvirtuados seriam a exceção. Para eles a prisão. Não simplesmente um cárcere, que os isolassem da convivência com os outros, mas uma escola, de cidadania, ética e, principalmente, que os ensinasse a enxergar melhor com o coração.

Paulo Viana